Não vou virar a página. Não agora. Não só porque é isso que as pessoas esperam de mim. Não tenho pressa. Há um mês e meio, eu dei a luz à meu filha natimorta. Estou triste e não quero fingir que não estou. Não agirei como se não tivesse acontecido nada, como se fosse eu fosse a mesma pessoa de antes, porque não sou e não o farei.
Estou triste! Tudo deveria ser diferente!! Eu estava feliz por tudo o que eu estava vivendo até então. Negar minha tristeza seria fingir, e essa não sou eu. Eu adoraria não ser assim, ser quem eu era antes, muito embora me digam que toda essa experiência me fará mais forte.
Fico quieta, mas não queria ser mais forte, não assim, com um golpe tão grande!!!
Eu não sou corajosa, não escolhi isso. Isso me aconteceu sem eu querer, sem que eu provocasse ou fizesse algo para que fosse comigo. Aprendi que na vida existem coisas que nos fogem ao controle. Que por mais que você planeje, sonhe, às vezes, esses acontecimentos não dependem de você.
Eu vivi uma situação extrema, passei por um nascimento para enfrentar a morte, como diabos eu vou ficar bem? Quando o pai de uma pessoa morre, não ocorre a ninguém dizer “outro virá” ou “você já tem uma mãe”. Ninguém substitui ninguém.
Eu não sei por que quando um bebê morre antes de nascer ou quando viveu um curto período de tempo, tendemos a minimizar o valor dessa vida e a dor dessa mãe. Uma vida curta, sim, mas para uma mãe é toda a vida de seu filho.
Estou triste! Não há dia nem noite que as memórias desse maldito dia não vêm à minha memória. Não há um dia que não pense “Eu queria ter o poder de voltar no tempo”. Não há dia em que eu não pense quantos dias eu esperei para conhecê-la, e como seria esse momento. Não há dia em que eu não me lembre de que eu a conheci, mas não do jeito que eu desejava conhecer. Porque quando morre alguém que já viveu muito, você tem memórias. Quando alguém que mal viveu morre, você tem ilusões. Mas está dilacerada.
Estou triste! Eu choro várias vezes por dia. Eu choro para desabafar minha raiva. Eu choro porque eu sinto isso, porque o corpo me exige isso, a todo e qualquer momento. Porque chorar é o que devemos fazer quando a vida nos derruba. Porque perdi uma filha. Eu choro e estou triste porque é justo e me é permitido, porque é saudável quando algo machuca ou parte meu coração. Eu choro porque alivia. Eu choro porque estou sobrevivendo. Eu choro porque estou triste.
Mas isso não significa que eu vou chorar o resto da vida ou que sempre estarei triste, não significa que eu vou cair de vez. Isso significa que eu vou viver o luto tanto quanto eu posso, que vou sorrir quando eu puder, que às vezes eu estarei bem, mas também terei recaídas. Isso significa que estou tentando, que a vida continua, mesmo que a minha vida não seja a mesma. Isso significa que eu continuarei a sentir dor, mas cada vez menos, significa que não vou sobreviver mas sim viver . Não vou esquecer, vou aprender a viver com isso, o que não é pouco. E ficarei feliz, eu sei disso. Mas tudo na hora certa.
“Fingir a invisibilidade do luto é fingir a invisibilidade da morte, da doença perecível, da doença; em suma, da fragilidade de nossa humanidade. “Freud