Minha querida amiga mamãe,
Eu vejo você. Eu vejo a felicidade radiando do seu sorriso amável enquanto você abraça ansiosamente sua preciosa criança. Você esperou um bom tempo pela maternidade; eu sei sem nenhuma duvida que você merece esta felicidade. Nós somos amigas por tanto tempo, dividindo sucessos e fracassos, nos ajudando, rindo juntas… Eu sempre tive nossa amizade como uma das minhas mais queridas bênçãos. Eu amo você.
Você esteve aqui por mim de todas as maneiras que pôde quando eu perdi minha bebê e o mundo todo afundou a minha volta. Eu me lembro claramente de fazer aquele telefonema para você; eu não queria que você soubesse sobre minha perda de ninguém mais. Eu ouvi você lamentar sua tristeza por mim do outro lado da linha, sabendo que você sentiu minha perda nos seus ossos, que sua alma estava doendo por mim. Você apertou bem forte seu filho e desejou com todo o seu coração que houvesse algo que você pudesse fazer para aliviar a minha dor.
Eu sei que tem sido difícil para você também, eu sei.
Então, você ficou grávida com seu próximo milagre. Mesmo no meu profundo sofrimento, eu fiquei muito feliz por você; eu ainda estou. Há esperança em meu coração de que talvez eu poderei acompanhar você logo e que poderemos caminhar nesta jornada juntas. Minhas esperanças foram se tornando um pouco desesperadas a medida que sua gravidez evoluía e eu sabia que eu não poderia compartilhar esta experiência com você. Eu me tornei mais distante; você entendeu. Você me deu o espaço de que eu precisava. Você censurou a sua própria animação e a alegria que estava sentindo. Eu sei que a minha perda persegue você de modos que eu não posso imaginar porque foi tão próxima. Eu estou desapontada comigo porque eu não estava aí para você como você esteve comigo quando minha vida virou de ponta-cabeça.
Está perto de um ano e meio que minha bebê voou deste mundo e, neste tempo, tantas coisas lindas aconteceram na sua vida. Você merece cada pedaço desta felicidade. Mas pouca coisa mudou na minha pequena existência neste mesmo período de tempo, embora nem um único ponto seja sua culpa, eu me encontro em pura miséria quando observo a sua felicidade. Isto é um contraste direto com a minha própria vida em todos os lados. Eu sou uma estranha olhando de fora. As alegrias que você está experimentando são as mesmas que eu deveria estar sentindo. Mas eu não estou. Eu ainda estou aqui como que paralisada, me doendo por não ter os mesmos privilégios que você tem.
Eu sei que você sente falta de sua velha amiga… eu sinto falta dela também. Eu não sou mais a pessoa que costumava ser. O luto criou novas características em mim, jogou fora um pouco da suavidade, me fez mais inacessível. Eu tenho dificuldade em superar meu vazio e minha tristeza. Às vezes, ser testemunha da sua vida em família aumenta a dor do meu luto. Tem tempos em que eu me esquivo de seus telefonemas e respondo por mensagem ao invés de falar com você; às vezes, eu não sou capaz de fazer nada além disto. Eu me desprezo por estes comportamentos, mas me sinto impotente em mudá-los.
Eu me pego chorando depois de muitas de suas tentativas de contato, fico brava comigo por deixar as lágrimas quentes caírem no meu rosto, desejando de todo o meu coração que eu possa parar de sentir esta dor no coração e esta inveja. Como eu posso dizer para você, uma amiga que me é tão cara, que sua felicidade é tão difícil para mim? Como dizer para você que, só de pensar em entrar na sua casa feliz e abençoada, eu sinto dor? Eu nunca pensei que era possível sentir felicidade genuína e ciúme incapacitante por alguém ao mesmo tempo. Na minha triste existência isto acontece todo o tempo. Isto machuca. Eu anseio por minha própria versão do que você tem; eu só quero o que é normal, como você. Eu me detesto todo o tempo que sinto o ciúmes tomar conta de mim, mas eu não consigo controlar.
Eu perdi tantas coisas na minha vida após a perda; eu tenho medo de talvez perder você. Eu acredito que você queira que eu tenha o que você tem também, e que você se alegre comigo se um dia eu ganhar as mesmas bênçãos. Por agora, eu sei que é frustrante. Não é sua culpa que a minha vida se transformou em um pesadelo, como também não é minha culpa. Não é sua culpa que o pensamento de segurar seu bebê nos braços me deixa em extrema ansiedade. Não é sua culpa que você continua tentando se aproximar de mim e eu não posso corresponder ao esforço. Não é sua culpa que eu me isolei de você e sua linda família porque eu tenho medo de colocar um silenciador em seu contentamento. Você não é a culpada por nada disto, e eu sinto muito.
Eu odeio o jeito como as coisas são, e eu sinto sua falta. Eu desejo tantas coisas… eu desejo que minha filha pudesse ser amiga de seus filhos. Eu desejo que pudéssemos planejar o aniversário de nossas crianças juntas, dividir roupas usadas, que eles pudessem brincar juntos. Eu desejo não me sentir deste jeito, eu sinto falta de todas as memórias que não tivemos a chance de ter e de coisas que talvez nunca serão.
Obrigada por me amar e esforçar-se para me entender enquanto navego minha vida depois da perda. Eu esperava não ter que pedir mais paciência de você, mas eu necessito. Eu espero que você saiba em seu coração do meu amor e admiração por você e eu aprecio sua amizade. Eu espero que, algum dia, as coisas sejam como costumavam ser entre a gente. Até lá, muito obrigada por não desistir de mim.
Com amor,
Sua amiga mamãe enlutada.
Em 1997 estava grávida de meu 1º e único filho, hoje com 20 anos de idade. Tinha várias colegas, de outras Secretarias, também gestantes, com partos previstos para diferentes meses. Mas uma delas, infelizmente, perdeu seu bebê ainda no ventre, já perto do final da gestação… Na 1ª vez que a vi após a perda, o olhar de raiva, de ódio, que ela me dirigiu me deram medo!!!! Eu estava no 6º mês de gravidez. Nunca fomos próximas, apenas nos cumprimentávamos quando nos víamos. A partir daquele dia, sempre que a via chegar no corredor do setor onde trabalho, sumia de seu campo de visão: 1º para proteger meu filho e a mim daquele olhar tão pesado; depois para evitar que ela ficasse ainda mais triste por me ver grávida, enquanto seu ventre havia se esvaziado, deixando sua alma e seus braços sem terem a quem acolher… Passei por crises de hipertensão, pré-eclâmpsia com 3 dias de internação, mas meu filho e eu fomos abençoados e saímos dessa, ele sem sequelas, eu, hipertensa até hoje.
A colega da qual eu fugia, faleceu anos atrás, infelizmente ela nunca tentou conversar comigo e nem me deu acesso para fazer o mesmo com ela.
Espero que de onde ela está, com o filhinho dela, ela entenda que eu não fui responsável pela perda dela, nem tinha culpa por seguir grávida…
Perdão se as choco com meu depoimento, mas desejo que ele tenha alguma utilidade para alguém!
Minha avó, que pariu 19 filhos, perdeu 12 – entre bebês e crianças de várias idades, sempre nos dizia, que gravidez não era doença, mas que as grávidas tem 1 pé sobre a terra e outro no além! Dos 7 filhos que chegaram à idade adulta, ela enterrou 2, a 3ª e o 2º – após a perda desse último, ela desistiu de viver e faleceu 5 anos depois – era o preferido dela, seu 1º filho homem – aquele que a fazia se sentir uma verdadeira Rainha! Ela viveu com esses lutos todos, nem sei como…
Gostei de saber que vcs existem e que tem como missão acolher mães de luto! Para vcs, deixo uma frase minha: “À medida em que aliviamos a carga dos outros, a nossa se torna cada vez mais leve!” Um abraço a vcs todas